prendam os suspeitos de sempre os olhos azuis de adele h. brilham na noite negra, ela sempre aguardará por seu amado com lúcida e serena loucura. — o amor é a mais negra das pestes, mas ninguém morre de amor, e quase sempre passa. susan
alexander kane grita para que forrest gump cale a boca. humphrey
bogart morde a nuca suculenta de lauren bacall. —
nós sempre teremos paris. |
tempo ...........aos meus avós Ponteiros são nada; tempo não se ata a números. Tempo é bicho sem Deus, livre, deliciosamente livre. Tudo é a sua morada. Tempo cura
tudo, Tempo é
o verde do broto, Tempo é
o sangue cicatrizado na pele. Tempo é
carro preso no engarrafamento. Tempo passa
passa tempo, Tempo é aceitação. |
acalento Minha mãe acordando às cinco da manhã Preparando o café para a família Descascando as frutas Estendendo as roupas no varal Lavando os pratos com a água fria Em dia de inverno O almoço solitário A faxina, o pó Sempre renovado nos móveis Carregando as pesadas sacolas do supermercado Depois renunciando à novela Para preparar o jantar Mais uma de tantas Pequenas grandes renúncias Acordada até tarde, o coração apertado Até que todos estejam Seguros em casa. Meu pai
pegando o ônibus lotado das seis |
breves Meditações zen ao som de um walkman /// |
tartamudeio Penso em ruivas xipófagas, em guitarras queimando como incensos, em Humphrey Bogart mascando chicletes, no céu iridescente e nos desejos que eu e você sussurávamos um para o outro quando víamos estrelas cadentes relampagueando a noite de um outubro perdido, quando éramos dois adolescentes cercados de espinhas e dúvidas existenciais por todos os lados, receosos do mundo, mas repletos de impulsos juvenis. Penso em Thelonius Monk morando em uma casa de Lego, em metáforas despojadas e versos sobre abóboras flutuantes, em Cheech e Chong cantando sem sucesso as garotas de um videokê, e que depois da torrente de nãos recebidos terminavam a noite masturbando-se um ao outro. Penso nas gargalhadas gostosas que demos imaginando a cena, na sua risada crepitante que alimentava o fogo das estrelas, em você sentada de cócoras acendendo um cigarro atrás do outro, enquanto eu via a fumaça subir ao céu desenhando efígies de presidentes cassados e trompetistas mortos. Penso em avestruzes enterrando suas cabeças no deserto australiano, no destino dos siriris depois que perdem as asas, na fúria dos meteoros e no medo de viver. Penso em tonéis de azeite, nos afluentes do Amazonas, na catadupa de idéias desconexas que vêm como uma enxurrada, rompendo os diques da clareza num mar de interrogações. Penso no uniforme do Coringa, na maleta xadrez do Gato Félix, no Linus esperando a noite inteira pela Grande Abóbora como se fosse Godot, nos robôs de Isaac Babel, nos filmes inacabados de Orson Welles. Penso em filmes iugoslavos com legendas em sânscrito, e em nós dois socando pregos. Penso na raiz cúbica de 270773, no significado de "klaatu barada niktu", na escalação do Guarani em 1978, na cabeça de Robespierre depois da decapitação, no brilho dos olhos de James Joyce ao encontrar a calcinha suja de Nora. Penso em amoras amassadas, em vinicultores chupando uvas e deixando-as secar ao sol, para vendê-las depois como passas. Penso no último mergulho de Jeff Buckley, em Thelma e Louise dando-se as mãos antes de voar para o nada, na cadela Laika latindo para a surdez das estrelas. Penso no medo que tenho de dançarinos irlandeses e contorcionistas de circo, em quadrinhos velhos de Carl Barks, em melodias tonitruantes, no silêncio de John Cage. Penso em você pedindo provas de amor, na risada que dei ao ler que um homem foi flagrado trepando com um frango congelado, em minhas tergiversações dispersas, em seus olhos dardejando indiferença, em Ian Curtis pendurado pela corda que o enforcou, na etiqueta presa ao dedão de Marilyn Monroe no necrotério de Los Angeles, em carpideiras sorridentes e nas piadas bestas que sempre extraíam um sorriso do seu rosto, mas que já não tinham o mesmo efeito. Penso em Pasárgada, em Hiroshima, em Yoknapatawpha, em Cracatoa, em Atlântida, em Patópolis, em São Paulo. Penso no encontro de Kublai Khan com Marco Pólo. Penso em olhos de ímã e versos que rimam. Recordo você: tudo penso, e nada falo.
Pequeno
Tratado Sobre a Mortalidade do Amor Todos os dias morre um amor. Às vezes com uma explosão, quase sempre com um suspiro. Todos os dias morre um amor, embora nós, românticos mais na teoria que na prática, relutemos em admitir. Porque nada é mais dolorido do que a constatação de um fracasso. De saber que, mais uma vez, um amor morreu. Porque, por mais que não queiramos aprender, a vida sempre nos ensina alguma coisa. E esta é a lição: amores morrem. Todos os dias um amor é assassinado. Com a adaga do tédio, a cicuta da indiferença, a forca do escárnio, a metralhadora da traição. A sacola de presentes devolvidos, os ponteiros tiquetaqueando no relógio, o silêncio insuportável depois de uma discussão: todo crime deixa evidências. Todos
nós fomos assassinos um dia. Há aqueles que, como o Lee
Harvey Oswald, se refugiam em salas de cinema vazias. Ou preferem se
esconder debaixo da cama, ao lado do bicho papão. Outros confessam
sua culpa em altos brados, e fazem de pinico os ouvidos de infelizes
garçons. Há aqueles que negam, veementemente, participação
no crime, e buscam por novas vítimas em salas de chat ou pistas
de danceteria, sem dor ou remorso. Os mais periculosos aproveitam sua
experiência de criminosos para escrever livros de auto-ajuda,
com nomes paradoxais como "O Amor Inteligente", ou romances
açucarados de banca de jornal, do tipo "A Paixão
Tem Olhos Azuis", difundindo ao mundo ilusões fatais aos
corações sem cicatrizes. Existem os amores-zumbis, aqueles que se recusam a admitir que morreram. São capazes de perdurar anos, mortos-vivos sobre a Terra teimando em resistir à base de camas separadas, beijos burocráticos, sexo sem tesão. Estes não querem ser sacrificados, e, à semelhança dos zumbis hollywoodianos, também se alimentam de cérebros humanos, e definharão até se tornarem laranjas chupadas. Existem os amores-vegetais, aqueles que vivem em permanente estado de letargia, comuns principalmente entre os amantes platônicos que recordarão até o fim de seus dias o sorriso daquela ruivinha da 4a. série, ou entre fãs que até hoje suspiram em frente a um pôster do Elvis Presley (e, pior, da fase havaiana). Mas titubeio em dizer que isso possa ser classificado como amor (Bah, isso não é amor. Amor vivido só do pescoço pra cima não é amor). Existem, por fim, os amores-fênix. Aqueles que, apesar da luta diária pela sobrevivência, das contas a pagar, da paixão que escasseia com o decorrer dos anos, da mesa-redonda no final de domingo, das calcinhas penduradas no chuveiro e das brigas que não levam a nada, ressuscitam das cinzas a cada fim de dia, e perduram: teimosos, e belos, e cegos, e intensos. Mas estes são raríssimos, e há quem duvide de sua existência. Alguns os chamam de amores-unicórnio, porque são de uma beleza tão pura e rara que jamais poderiam ter existido, a não ser como lendas. Mas não quero acreditar nisso. Um dia vou colocar um anúncio, bem espalhafatoso, no jornal. PROCURA-SE:
AMOR-FÊNIX
ALEXANDRE
INAGAKI já foi analista de câmbio, gerente
de locadora de vídeo, escritor de mangás e garoto de programa,
tendo anunciado seu corpo com a alcunha de "Samurai do Amor".
Hoje, está finalmente recuperado para o convívio com a
sociedade, após ter freqüentado reuniões dos Mentirosos
Anônimos. É o (ir)responsável pelo blogue Pensar
Enlouquece, Pense Nisto, e ainda ousa despejar suas letrinhas
em mais um monte de páginas encontráveis nas melhores
Googles do ramo, dentre elas o Burburinho,
o Virunduns. Colabora com a revista Flashback e tem uma página no Multiply. Enquanto não concretiza seus planos de ser mais desejado do que o Brad Pitt, organiza todos os seus sonhos
em fila mais ou menos indiana, tangendo-os vida afora feito o Flautista
de Hamelin. Em tempo: é leonino, fiel, torcedor do Guarani e
cinéfilo, mas não acreditem em tudo que lhes diz.
|